No Brasil fala-se muito em corrupção política construindo-se uma ideia equivocada de que a corrupção limita-se ao meio político-partidário. O maior e mais eficaz meio de divulgação e fiscalização dos episódios de corrupção seria a grande mídia ou mídia de massa. Grande é a legitimidade auto propagada pelos meios de comunicação a si próprios, através de discursos adjetivados de termos como “imparcialidade”, “verdade”, “isenção”, entre outros que levam aos mesmos significados.
Existe uma tendência a crer que corrupção venha a existir em qualquer ação, grupo ou relação humana. Assim, tanto na política, como na religião, como na educação, como na mídia, o ser humano tende a realizar ações que venham a destruir ou alterar a essência das coisas, sendo esta a conotação filosófica para corrupção.
É justamente essa última, a mídia, que parece desconsiderar a possibilidade dela própria, de agir de forma corrupta, pois ela se auto declara o arauto da liberdade de expressão, da verdade e consequentemente a face imaculada do processo democrático, acima de qualquer suspeita. Tal posicionamento parece ser no mínimo ingênuo para não falar presunçoso. Há de se pensar que a mídia também é corrupta no momento que perde o rótulo da imparcialidade, e ainda, se reveste de preconceitos contra as vítimas das mazelas sociais.
O primeiro rótulo a ser questionado chama-se imparcialidade, uma vez que não causa nenhum susto afirmar que a grande mídia no Brasil, sendo propriedade de um punhado de famílias poderosas, apresenta-se totalmente tendenciosa politicamente, com forte viés de direita e ideologicamente elitista, contaminada com toda uma carga de preconceitos emanados das classes econômica e politicamente dominantes.
Um real exemplo de visão preconceituosa combinada com estratégia de manipulação emerge com os ataques feitos por algumas revistas, jornais, rádios, etc, contra o humorista Tiririca que candidatou-se a deputado federal pelo Estado de São Paulo. Revistas semanais de tendências de direita, têm veiculado reportagens em que questionam o grau de instrução do candidato Tiririca, uma vez que candidatos analfabetos são inelegíveis por lei. Tão grande a importância dada a esta possibilidade que o humorista virou reportagem de capa da revista Época.
Interessante, para não dizer preocupante é o fato dos nomes dos políticos com candidaturas barradas pela Lei da Ficha Limpa, também não figurarem em reportagens de capa das principais revistas semanais. Por que a mídia não mostra os nomes das dezenas de fichas sujas que estão se candidatando? Por que não mostra seus rostos, suas acusações, seus processos? Por que a mídia pegou para bode expiatório justamente o Tiririca? Seria pelo fato dele provavelmente não saber ler ou escrever? Ou seria puro preconceito em relação aos iletrados, vítimas de letrados corruptos que roubaram e roubam o dinheiro destinado a escolas, creches, casas populares, merenda escolar, transporte escolar, etc? Por que a mídia insensível dificulta mais a vida de quem vem de baixo, que não teve provavelmente oportunidade de estudar em virtude da corrupção de outrora?
As mentes que vomitam contra Tiririca seriam as mesmas que continuam vomitando contra o nordestino sem nível superior que chegou a presidência e por isso, foi questionado se teria condições de governar um país como o Brasil?
O que seria mais importante para a mídia mostrar nas capas das revistas de maior venda, o caráter ou o grau de instrução de um candidato? Seria o baixo grau de instrução um fator de corruptibilidade? Se assim for, por que os intelectuais, letrados, doutores, escritores, acadêmicos, etc, parecem tão facilmente vulneráveis a sucumbirem às propostas de corrupção?
Vale mais o alfabeto do que a honestidade e o caráter?
Vale mais o alfabeto do que a honestidade e o caráter?
É essencial ser alfabetizado para não se corromper? Então por que a grande maioria dos corruptos de carteirinha, que roubam de forma desavergonhada o povo, são em grande maioria intelectuais, muitos deles com com ampla formação acadêmica?
Em fim, defender enfaticamente o papel dos meios de comunicação na construção e consolidação do processo democrático, desde o acompanhamento, à fiscalização, à denúncia e à conscientização da população é essencial e salutar, no entanto, desde que a atuação desta mídia esteja também sujeita a uma análise crítica e à críticas quando assim for entendido, pois ninguém e nada está acima de qualquer suspeita e todos devem fiscalizar-se uns aos outros.
Fernando Carneiro